Couro Cru & Carne Viva
I
ao batizarem-te
deram-te o nome:
posto que a tua profissão
é abrir-te em camas
dar-te em ferro
ouro
prata
rios
peixes
minas
mata
deixar que os abutres
devorem-te na carne
o derradeiro verme
II
salgado mar de fezes
batendo nas muralhas
do meu sangue confidente
quem botou o branco
na bandeira de alfenas
na certa se esqueceu
das orações dos penitentes
e da corda que estraçalha
com os culhões de Tiradentes
III
salve lindo pendão que balança
entre as pernas abertas da paz
tua nobre sifilítica herança
dos rendez-vous de impérios atrás
IV
meu coração
é tão hipócrita que não janta
e mais imbecil que ainda canta:
ou
viram
no Ipiranga
às margens plácidas
uma bandeira arriada
num país que não levanta
V
só desfraldando
é que a gente avacalha
com as chaves dos mistérios
dessa terra tão servil
tirania sacanagem safadeza
tudo rima uma beleza
1º de Abril
telefonaram-me
avisando-me que vinhas
na noite uma estrela
ainda brigava contra a escuridão
na rua sob patas
tombavam homens indefesos
esperei-te 20 anos
até hoje não vieste à minha porta
VI
o poeta estraçalha a bandeira
raia o sol marginal quarta feira
na Geléia Geral brasileira
o céu de abril não é de anil
nem general é my Brazyl
minha verde/amarela esperança
Portugal já vendeu para França
e coração latino balança
entre o mar do dólar do norte
e o chão dos cruzeiros do sul
VII
o poeta esfrangalha a bandeira
raia o sol marginal sexta feira
nesta porra estrangeira e azul
que há muito índio dizia:
meu coração marçal tupã
sangra tupy & rock and roll
meu sangue tupiniquim
em corpo tupinambá
samba jongo maculelê
maracatu boi bumbá
a veia de curumim
é coca cola & guaraná
VIII
o sangue rola no parque
o sonho ralo no tanque
nada a ver com tipo dark
e muito menos com punk
meu vício letal é baiafro
com ódio mortal de yank
IX
ó baby a coisa por aqui
não mudou nada
embora sejam outras
siglas no emblema
espada continua a ser espada
poema continua a ser poema
BraZílica Pereira
desta sopa de farelos
PESSOA
não tenho pretensões
de ser moderno
nem escrevo poesia
pensando em ser eterno.
veja na minha língua
as labaredas do inferno
e só use o meu poema
com a força de quem xinga.
GENITAL
pasto no cosmo
a soja secular de Jardinópolis
onde os discos-voadores
sobrevoam meu nariz
na cara das metrópoles.
no centro ao sul
os cemitérios
possuem mais mistérios
que a nossa vã filosofia.
tem um animal de vagina espacial
na poesia
&
e um grande pênis roxo
milenar
feito espiral em círculo
preparando imenso orgasmo
pra festejar o fim do século.
TROPICALIRISMO
GIRAssóis pousando
Nu – teu corpo: festa
beija-flor seresta
poesia fosse
esse sol que emana
no teu fogo farto
lambuzando a uva
de saliva doce.
LENÇÓIS DE RENDA
poderia abrir teu corpo
com os meus dentes
rasgar panos e sedas
com as unhas
arreganhar as tuas fendas
desatar todos os nós
da tua cama arrancar os cobertores
rasgando as rendas dos lençóis
perpetuar a ferro e fogo
minhas marcas no teu útero
meus desejos imorais
maldizendo a hora soberana
com a força sobre humana dos mortais
quando vens me oferecer migalha e fruto
como quem dá de comer aos animais
ALUCINAÇÕES (IN)TERPOÉTICAS
O QUE é que mora em tua boca bia? um deus. um anjo. ou muitos dentes claros como os olhos do diabo e uma estrela como guia?
O QUE é que arde em tua boca bia? azeite sal pimenta e alho résteas de cebola um cheiro azedo de cozinha tua boca é como a minha?
O QUE é que pulsa em tua boca bia? mar de eternas ondas que covardes não navegam, rios de águas sujas onde os peixes se apagam.
ou um fogo cada vez mais Dante como este em minha boca de poeta delirante nesta noite cada vez mais dia em que acendo os meus infernos em tua boca bia?
LUNÁTICA
um gato noturno
atira pedras nas estrelas
palavras e mais palavras
na carne da princesa.
onde o papel não bate
onde o pincel não toca.
o gato noturno lambe a barriga
bem perto da virilha
e trepa
no muro mais próximo
tentando alcançar o outro lado da lua
em seu instante letal
de desespero e solidão.
FROYDIANA
azul são os teus olhos
a cor dos pelos não conheço
teus seios ainda não toquei
Dracena – é uma terra roxa
nave extra terrena
que humanos não decifraram
pequena vagina virgem
onde os dedos ainda não entraram
e os cachos de uvas
apodrecem nos teus dentes
com um cheiro de leite ardente
esguichando na distância.
pá t ria a(r)mada
só me queira assim caçado
mestiço vadio latino
leão feroz cão danado
perturbando o seu destino
e só me queira encapetado
profanando aqueles hinos
malandro moleque safado
depravando os seus meninos
só me queira enfeitiçado
veloz macio felino
em pelo nu depravado
em sua cama sol à pino
e só me queira desalmado
cão algoz e assassino
duplamente descarado
quando escrevo e não assino
alguma poesia
não bastaria a poesia cristalina se rasgando o corpo estão muitas meninas tentando a sorte em cada porta de metrô e nós poetas desvendando palavrinhas vamos dançando uma vertigem no tal circo voador.
não bastaria todo riso pelas praças nem o amor que os pombos tecem pelos milhos com os pardais despedaçando nas vidraças e as mulheres cuidando dos seus filhos.
não bastaria toda poesia que eu trago em minha alma um tanto porca, este postal com uma imagem meio Lorca: um bondinho aterrissando lá na Urca e esta cidade deitando água em meus destroços pois se o cristo redentor deixasse a pedra na certa nunca mais rezaria padre-nossos e na certa só faria poesia com os meus ossos.
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