segunda-feira, 11 de novembro de 2024

Artur Gomes - Poesia Afro Tupiniquim

quem tem medo 

de Artur Gomes?

 

linguagem

o que vai

de um lado da ponte

a outra

é o que sai da boca

o que entra é a língua

a que entorta

beija sem pedir licença

chupa morde goza

na entrada e na saída

sem ter adeus na despedida

 

na argamassa do abstrato

no abstrato do concreto

sou um vampiro bêbado

                              de sangue

assassinei os alfarrábios

para inventar meu alfabeto

  

Artur Kabrunco

leia mais no blog

https://fulinaimargem.blogspot.com/ 

DA CARNE DA PALAVRA
Tanussi Cardoso, poeta

Ator, produtor, videomaker e agitador cultural, o poeta Artur Gomes tem assinatura própria. SagaraNAgensFulinaímicas, seu mais novo livro, repleto de citações a partir do título, é a prova generosa do que afirmo: um inventário da pulsação de sua escritura, uma das mais iluminadas, entre os remanescentes da geração que se inicia nos anos 60-70.

Mesmo mirando certa desconstrução narrativa, o autor semeia as raízes culturais, germinadas naquelas décadas, que desabrocharam como furacão em nossa arte, principalmente vindas da canção popular, com sua palavra cantada, da poesia marginal, da Tropicália, do Concretismo, do poema-postal, da poesia visual, do cinema e, mesmo, dos quadrinhos.

Todo esse caldeirão cultural, todas essas referências e linguagens eram (são) muito próximas: Caetano, Gil, Torquato, Glauber, Leminski, Waly, Gullar, Hilda Hilst... E é desse quadro geracional (e bem lá atrás,Drummond, Murilo Mendes, Bandeira, Cabral, Quintana, Mário, Oswald e Guimarães Rosa - e principalmente -, a trilogia dos malditos: Rimbaud, Baudelaire e Mallarmé, além dos ecos do mestre beat, Allen Ginsberg), é desse manancial criativo que o poeta consegue desarmar o que nele se encontra envolto, de forma atávica, e reafirmar seus próprios tempo e potência, com o refinamento de sua fala.
Ao unir todo artefato onde exista possibilidade de poesia, Artur Gomes habita o lugar entre a palavra e a imagem, ao experimentar os sentidos que lhe chegam, sugando os afluentes existentes nas estruturas tradicionais de nossas artes, e reescrevendo-os a seu bel-prazer, num mix de nostalgia e futuro.

“visto uma vaca triste como a tua cara:
estrela cão gatilho morro
a poesia é o salto de uma vara”

De forma particular, o autor parece nos indicar algo que se confunde com transgressão, mas, ao mesmo tempo, mantém a linha tênue da poesia clássica, ao flertar com um romantismo de tintas fortes, e tocando, igualmente, o surrealismo, com uma violência verbal, que cheira à flor e à brutalidade.

Cada poema possui sua própria respiração, pausa e pontuação emocionais. Quem não gostar de sangrar e ir fundo no mais recôndito dos prazeres é melhor não prosseguir na leitura, mas quem tiver coragem de encarar a vida de frente e se deliciar com versos saborosos e extremamente imagéticos, entre no mundo do poeta, de imediato, e sentirá a alegria de descobrir uma poesia a que não se pode ficar indiferente.

“a língua escava entre os dentes
a palavra nova
fulinaimânica/sagarínica
algumas vezes muito prosa
outras vezes muito cínica”

Ainda que não pretenda novas experiências formais, o autor consegue alcançar perspectivas ousadas e radicais, em vários enquadramentos linguísticos, sempre disponíveis para o espanto, já que quando falamos de poesia, tocamos em lados inexatos, onde qualquer inversão de objetividade, e da própria realidade, é sempre bem-vinda. Sua poesia tem muito da desordem, da inobservância de regras, do não sentido, e apresenta um discurso contrário a certo pensamento lógico, fazendo surgir nas páginas do livro, algumas impurezas saudáveis.

“te procurei na Ipiranga
não te encontrei na Tiradentes
nas tuas tralhas tuas trilhas
nos trilhos tortos do Brás
fotografei os destroços
na íris do satanás”

SagaraNAgensFulinaímicas nos apresenta uma peça de tom quase operístico e, paradoxalmente, para um só personagem: o Amor. E o desenho poético dessa montagem pressupõe uma grande carga lírica, alegórica e, tantas vezes, dramática, ao retratar o som universal da Paixão, perseguindo a imagem ideal dos limites do desejo. Seus versos são movidos por esse sentimento dionisíaco, e por tudo que é excesso, por tudo que é muito, como na música de Caetano.

“te amo
e amor não tem nome
pele ou sobrenome
não adianta chamar
que ele não vem quando se quer
porque tem seus próprios códigos
e segredos”

E indaga e responde:
“até quando esperaria?
até que alguém percebesse
que mesmo matando o amor
o amor não morreria”

Em seu texto, há uma espécie de dança frenética, onde interagem os quatro elementos do Universo – Terra, Água, Fogo e Ar – numa feitiçaria cósmica em contínuo transe mediúnico. Poesia que é seta certeira no coração dos caretas e dos conformados, ao apontar para as possíveis descobertas inesperadas da linguagem, inebriada pela vida, pelo cantar
amoroso, pelo encontro dos corpos.

“e para espanto dos decentes
te levo ao ato consagrado
se te despir for só pecado
é só pecar que me interessa”

Dono de uma sonoridade vocabular repleta de aliterações e assonâncias, que remetem à intensa oralidade e à pulsão musical, refletindo no leitor o desejo de ler os poemas em voz alta, o poeta brinca com as palavras, cria neologismos, utiliza-se de colagens originais, e soma ao seu vasto arsenal de recursos, o uso das antíteses, dos paradoxos, das metonímias, das metáforas, dos pleonasmos e, principalmente, das hipérboles, através de poemas de impactante beleza. Esse jogo vocabular, que a tudo harmoniza, transforma a dinâmica do verso, dá agilidade, tensão e ritmo envolventes a uma poesia elétrica e eletrizante. Um bloco de tesão carnavalizante e tropical - atrás de Artur Gomes só não vai quem não o leu.

“quero dizer que ainda é cedo
ainda tenho um samba/enredo
tudo em nós é carnaval”

De forma lúdica e irônica, reconstrói, ou reverte, as intenções de Guimarães Rosa, quando Sagarana se mistura à ideia de paisagens e ao sentido de sacanagens; e às de Mario de Andrade - onde Macunaíma reparte seu teor catártico em poéticas folias, ou em fulias de imagens, ou seja, em fulinaímicas poesias, banhadas de caos e humor.

“é língua suja e grossa
visceral ilesa
pra lamber tudo que possa
vomitar na mesa
e me livrar da míngua
desta língua portuguesa”

Ao seguir de perto o conceito metafórico do processo crítico e cultural da Antropofagia, o artista ratifica seus valores, com sua língua literária, e reafirma o ato de não se deixar curvar diante de certa poesia catequisada pela mesmice e pelo lugar comum, distanciando-se da homogeneidade de certo academicismo impotente e de certos parâmetros poéticos com que já nos acostumamos. De acordo com o próprio autor, revelado em uma entrevista, SagaraNAgensFulinaímicas é um pedido de bênção a seus Mestres, imbuído do teor catártico que sua poesia contém, como o fragmento do poema que abre o livro:

“guima meu mestre guima
em mil perdões eu vos peço
por esta obra encarnada
na carne cabra da peste”

E afirma:
“só curto a palavra viva
odeio essa língua morta
poema que presta é linguagem
pratico a SagaraNAgem
no centro da rua torta”

No livro, os poemas se interpenetram, linguisticamente, libidinosos, doces e cruéis, vampiros de imagens ferrenhas, num aparente jogo de representação, onde o rosto do poeta se mostra e se esconde, de acordo com a mutação e o reflexo de seus espelhos interiores. Seus textos ora afirmam, ora desmentem o já dito, a nos lembrar um de seus ídolos, Raul Seixas, e a sua metamorfose ambulante.

Sentimentos contraditórios, como se o autor quisesse, propositalmente, escorregar segredos pelos nossos olhos,ambiguamente, rindo de nós, a nos instigar: “Desnudem a minha esfinge!”

“eu não sou flor que se cheire
nem mofo de língua morta”

Na verdade, sua poesia apresenta vários (re) cortes, várias direções, vários abismos e formas de olhar a vida e o mundo. Como se o verdadeiro Artur se dissolvesse em outros, a cada poema, e essa dissipação o transformasse em alguém improvável, impalpável. Errante. Artur Gomes, ele mesmo, são muitos. E todos nós.Afinal, “o poeta é um fingidor”, ou não?

“a carne que me cobre é fraca
a língua que me fala é faca
o olho que me olha vaca
alfa me querendo beta
juro que não sou poeta”

Tantas vezes escatológico e sensual, numa performance textual que parece uma metralhadora giratória, o seu imaginário poético explode em tatuagens, navalhas, sangue, cicatrizes, punhais, facas, cuspe, pus, línguas, dedos, dentes, unhas, seios, paus, porra, carne, flores e lençóis, como um paraíso construído num inferno, e toca o nosso céu interior, nas ondas de um mar verde escondido em nosso peito. Na nossa melhor alma.

Sem falsos pudores, o autor procura, em seu liquidificador de palavras, misturar o erótico, o profano e o sagrado, com cortes de cinismo e grande dose de humana solidariedade. Equilibrista na corda-bamba, sem rede de proteção, entre razão e delírio, instiga dualidades com seus versos de alta voltagem poética. Com linguagem rebuscada, seu trabalho ultrapassa os limites das páginas do livro, e reverbera como tambor, mesmo após o término de sua leitura.

“a carne da palavra
: POESIA
l a v r a q u e s o l e t r o
todo Dia”

A poesia de cunho social é, igualmente, referência obrigatória em seu trabalho, desde o início de sua carreira literária, marcadamente, em Jesus Cristo Cortador de Cana, de 1979, mas, principalmente, no memorável e premiado O Boi Pintadinho, de 1980.

Esses poemas político-sociais, junto ao tema amoroso, também encontramos em outras obras importantes do poeta, como Suor & Cio, de 1985, Couro Cru & Carne Viva, de 1987 e 20 Poemas com Gosto de JardiNÓpolis& Uma Canção com Sabor de Campos, de 1990, e se inserem em todos os seus livros posteriores, que culminam agora em SagaraNAgensFulinaímicas.

Em suas viagens imemoriais, o poeta mistura São Paulo, Copacabana, Búzios, calçadas, origem, chão, mares, cactos, sertão, onde tudo sangra de maneira violentamente bela e sem volta. Só a língua a ser reconstruída em poesia.

“ando por são Paulo meio Araraquara
a pele índia do meu corpo
concha de sangue em tua veia
sangrada ao sol na carne clara”

Artur Gomes sabe que ao escritor cabe proporcionar beleza e prazer. Entende que a poesia existe para expressar a condição humana, tocar o coração e a emoção do outro, e dar oportunidade para que seu interlocutor tenha chances de conhecer-se mais e melhor. E que só há um meio de o poeta conseguir seu intento: cuidar e aperfeiçoar a linguagem.

Sempre coerente, Artur Gomes sublinha o essencial de seu pensamento, ratificando em seu trabalho que as duas maiores palavras da nossa língua são amor e liberdade.

“a coisa que me habita é pólvora
dinamite em ponto de explosão
o país em que habito é nunca
me verás rendido a normas
ou leis que me impeçam a fala”

SagaraNAgensFulinaímicas veio confirmar o que os leitores do poeta já sabiam: Artur Gomes é um artista instigante, um cantador que desafia rótulos. No seu fazer poético, há um desfocar proposital da realidade, onírico e cinematográfico, que mergulha em constantes vulcões, em permanente ebulição – um texto em contínuo movimento.

Sua poesia metalinguística, plástica, furiosa, delicada, passional, corporal, sexual, desbocada, invasiva, libertária, corrosiva, visceral, abusada, dissonante, épica é, antes de tudo, a poesia do livre desejo e do desejo livre. Nela, não há espaço para o silêncio: é berro, uivo, canto e dor. Pulsão. Textura de vida. Uma poesia que arde (em) seu rio de palavras.

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https://fulinaimargem.blogspot.com/


Sarau Cultural

A Vitória Com Você

Dia 22 novembro - 19h

Local - CDL - Av. 7 de Setembro, 274

Campos dos Goytacazes-RJ

comemoração do aniversário da nossa querida amiga

Glória Jacinto e a eleição para Câmara de Vereadores do

Professor Wainer Teixeira de Castro

 

"o melhor está por vir"

 

Cezane não pintava flores

montado em seu cavalo alado

despeja cores

no corpo da mulher amada

com os pincéis

encravados entre as coxas

transformou Hollandas

em quintais de vento

reINventou o tempo

na hora de pintar

 

Artur Gomes

Fulinaíma MultiProjetos

22 99815-1268 – fulinaima@gmail.com

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DA CARNE DA PALAVRA
Tanussi Cardoso, poeta

Ator, produtor, videomaker e agitador cultural, o poeta Artur Gomes tem assinatura própria. SagaraNAgensFulinaímicas, seu mais novo livro, repleto de citações a partir do título, é a prova generosa do que afirmo: um inventário da pulsação de sua escritura, uma das mais iluminadas, entre os remanescentes da geração que se inicia nos anos 60-70.

Mesmo mirando certa desconstrução narrativa, o autor semeia as raízes culturais, germinadas naquelas décadas, que desabrocharam como furacão em nossa arte, principalmente vindas da canção popular, com sua palavra cantada, da poesia marginal, da Tropicália, do Concretismo, do poema-postal, da poesia visual, do cinema e, mesmo, dos quadrinhos.

Todo esse caldeirão cultural, todas essas referências e linguagens eram (são) muito próximas: Caetano, Gil, Torquato, Glauber, Leminski, Waly, Gullar, Hilda Hilst... E é desse quadro geracional (e bem lá atrás,Drummond, Murilo Mendes, Bandeira, Cabral, Quintana, Mário, Oswald e Guimarães Rosa - e principalmente -, a trilogia dos malditos: Rimbaud, Baudelaire e Mallarmé, além dos ecos do mestre beat, Allen Ginsberg), é desse manancial criativo que o poeta consegue desarmar o que nele se encontra envolto, de forma atávica, e reafirmar seus próprios tempo e potência, com o refinamento de sua fala.
Ao unir todo artefato onde exista possibilidade de poesia, Artur Gomes habita o lugar entre a palavra e a imagem, ao experimentar os sentidos que lhe chegam, sugando os afluentes existentes nas estruturas tradicionais de nossas artes, e reescrevendo-os a seu bel-prazer, num mix de nostalgia e futuro.

“visto uma vaca triste como a tua cara:
estrela cão gatilho morro
a poesia é o salto de uma vara”

De forma particular, o autor parece nos indicar algo que se confunde com transgressão, mas, ao mesmo tempo, mantém a linha tênue da poesia clássica, ao flertar com um romantismo de tintas fortes, e tocando, igualmente, o surrealismo, com uma violência verbal, que cheira à flor e à brutalidade.

Cada poema possui sua própria respiração, pausa e pontuação emocionais. Quem não gostar de sangrar e ir fundo no mais recôndito dos prazeres é melhor não prosseguir na leitura, mas quem tiver coragem de encarar a vida de frente e se deliciar com versos saborosos e extremamente imagéticos, entre no mundo do poeta, de imediato, e sentirá a alegria de descobrir uma poesia a que não se pode ficar indiferente.

“a língua escava entre os dentes
a palavra nova
fulinaimânica/sagarínica
algumas vezes muito prosa
outras vezes muito cínica”

Ainda que não pretenda novas experiências formais, o autor consegue alcançar perspectivas ousadas e radicais, em vários enquadramentos linguísticos, sempre disponíveis para o espanto, já que quando falamos de poesia, tocamos em lados inexatos, onde qualquer inversão de objetividade, e da própria realidade, é sempre bem-vinda. Sua poesia tem muito da desordem, da inobservância de regras, do não sentido, e apresenta um discurso contrário a certo pensamento lógico, fazendo surgir nas páginas do livro, algumas impurezas saudáveis.

“te procurei na Ipiranga
não te encontrei na Tiradentes
nas tuas tralhas tuas trilhas
nos trilhos tortos do Brás
fotografei os destroços
na íris do satanás”

SagaraNAgensFulinaímicas nos apresenta uma peça de tom quase operístico e, paradoxalmente, para um só personagem: o Amor. E o desenho poético dessa montagem pressupõe uma grande carga lírica, alegórica e, tantas vezes, dramática, ao retratar o som universal da Paixão, perseguindo a imagem ideal dos limites do desejo. Seus versos são movidos por esse sentimento dionisíaco, e por tudo que é excesso, por tudo que é muito, como na música de Caetano.

“te amo
e amor não tem nome
pele ou sobrenome
não adianta chamar
que ele não vem quando se quer
porque tem seus próprios códigos
e segredos”

E indaga e responde:
“até quando esperaria?
até que alguém percebesse
que mesmo matando o amor
o amor não morreria”

Em seu texto, há uma espécie de dança frenética, onde interagem os quatro elementos do Universo – Terra, Água, Fogo e Ar – numa feitiçaria cósmica em contínuo transe mediúnico. Poesia que é seta certeira no coração dos caretas e dos conformados, ao apontar para as possíveis descobertas inesperadas da linguagem, inebriada pela vida, pelo cantar
amoroso, pelo encontro dos corpos.

“e para espanto dos decentes
te levo ao ato consagrado
se te despir for só pecado
é só pecar que me interessa”

Dono de uma sonoridade vocabular repleta de aliterações e assonâncias, que remetem à intensa oralidade e à pulsão musical, refletindo no leitor o desejo de ler os poemas em voz alta, o poeta brinca com as palavras, cria neologismos, utiliza-se de colagens originais, e soma ao seu vasto arsenal de recursos, o uso das antíteses, dos paradoxos, das metonímias, das metáforas, dos pleonasmos e, principalmente, das hipérboles, através de poemas de impactante beleza. Esse jogo vocabular, que a tudo harmoniza, transforma a dinâmica do verso, dá agilidade, tensão e ritmo envolventes a uma poesia elétrica e eletrizante. Um bloco de tesão carnavalizante e tropical - atrás de Artur Gomes só não vai quem não o leu.

“quero dizer que ainda é cedo
ainda tenho um samba/enredo
tudo em nós é carnaval”

De forma lúdica e irônica, reconstrói, ou reverte, as intenções de Guimarães Rosa, quando Sagarana se mistura à ideia de paisagens e ao sentido de sacanagens; e às de Mario de Andrade - onde Macunaíma reparte seu teor catártico em poéticas folias, ou em fulias de imagens, ou seja, em fulinaímicas poesias, banhadas de caos e humor.

“é língua suja e grossa
visceral ilesa
pra lamber tudo que possa
vomitar na mesa
e me livrar da míngua
desta língua portuguesa”

Ao seguir de perto o conceito metafórico do processo crítico e cultural da Antropofagia, o artista ratifica seus valores, com sua língua literária, e reafirma o ato de não se deixar curvar diante de certa poesia catequisada pela mesmice e pelo lugar comum, distanciando-se da homogeneidade de certo academicismo impotente e de certos parâmetros poéticos com que já nos acostumamos. De acordo com o próprio autor, revelado em uma entrevista, SagaraNAgensFulinaímicas é um pedido de bênção a seus Mestres, imbuído do teor catártico que sua poesia contém, como o fragmento do poema que abre o livro:

“guima meu mestre guima
em mil perdões eu vos peço
por esta obra encarnada
na carne cabra da peste”

E afirma:
“só curto a palavra viva
odeio essa língua morta
poema que presta é linguagem
pratico a SagaraNAgem
no centro da rua torta”

No livro, os poemas se interpenetram, linguisticamente, libidinosos, doces e cruéis, vampiros de imagens ferrenhas, num aparente jogo de representação, onde o rosto do poeta se mostra e se esconde, de acordo com a mutação e o reflexo de seus espelhos interiores. Seus textos ora afirmam, ora desmentem o já dito, a nos lembrar um de seus ídolos, Raul Seixas, e a sua metamorfose ambulante.

Sentimentos contraditórios, como se o autor quisesse, propositalmente, escorregar segredos pelos nossos olhos,ambiguamente, rindo de nós, a nos instigar: “Desnudem a minha esfinge!”

“eu não sou flor que se cheire
nem mofo de língua morta”

Na verdade, sua poesia apresenta vários (re) cortes, várias direções, vários abismos e formas de olhar a vida e o mundo. Como se o verdadeiro Artur se dissolvesse em outros, a cada poema, e essa dissipação o transformasse em alguém improvável, impalpável. Errante. Artur Gomes, ele mesmo, são muitos. E todos nós.Afinal, “o poeta é um fingidor”, ou não?

“a carne que me cobre é fraca
a língua que me fala é faca
o olho que me olha vaca
alfa me querendo beta
juro que não sou poeta”

Tantas vezes escatológico e sensual, numa performance textual que parece uma metralhadora giratória, o seu imaginário poético explode em tatuagens, navalhas, sangue, cicatrizes, punhais, facas, cuspe, pus, línguas, dedos, dentes, unhas, seios, paus, porra, carne, flores e lençóis, como um paraíso construído num inferno, e toca o nosso céu interior, nas ondas de um mar verde escondido em nosso peito. Na nossa melhor alma.

Sem falsos pudores, o autor procura, em seu liquidificador de palavras, misturar o erótico, o profano e o sagrado, com cortes de cinismo e grande dose de humana solidariedade. Equilibrista na corda-bamba, sem rede de proteção, entre razão e delírio, instiga dualidades com seus versos de alta voltagem poética. Com linguagem rebuscada, seu trabalho ultrapassa os limites das páginas do livro, e reverbera como tambor, mesmo após o término de sua leitura.

“a carne da palavra
: POESIA
l a v r a q u e s o l e t r o
todo Dia”

A poesia de cunho social é, igualmente, referência obrigatória em seu trabalho, desde o início de sua carreira literária, marcadamente, em Jesus Cristo Cortador de Cana, de 1979, mas, principalmente, no memorável e premiado O Boi Pintadinho, de 1980.

Esses poemas político-sociais, junto ao tema amoroso, também encontramos em outras obras importantes do poeta, como Suor & Cio, de 1985, Couro Cru & Carne Viva, de 1987 e 20 Poemas com Gosto de JardiNÓpolis& Uma Canção com Sabor de Campos, de 1990, e se inserem em todos os seus livros posteriores, que culminam agora em SagaraNAgensFulinaímicas.

Em suas viagens imemoriais, o poeta mistura São Paulo, Copacabana, Búzios, calçadas, origem, chão, mares, cactos, sertão, onde tudo sangra de maneira violentamente bela e sem volta. Só a língua a ser reconstruída em poesia.

“ando por são Paulo meio Araraquara
a pele índia do meu corpo
concha de sangue em tua veia
sangrada ao sol na carne clara”

Artur Gomes sabe que ao escritor cabe proporcionar beleza e prazer. Entende que a poesia existe para expressar a condição humana, tocar o coração e a emoção do outro, e dar oportunidade para que seu interlocutor tenha chances de conhecer-se mais e melhor. E que só há um meio de o poeta conseguir seu intento: cuidar e aperfeiçoar a linguagem.

Sempre coerente, Artur Gomes sublinha o essencial de seu pensamento, ratificando em seu trabalho que as duas maiores palavras da nossa língua são amor e liberdade.

“a coisa que me habita é pólvora
dinamite em ponto de explosão
o país em que habito é nunca
me verás rendido a normas
ou leis que me impeçam a fala”

SagaraNAgensFulinaímicas veio confirmar o que os leitores do poeta já sabiam: Artur Gomes é um artista instigante, um cantador que desafia rótulos. No seu fazer poético, há um desfocar proposital da realidade, onírico e cinematográfico, que mergulha em constantes vulcões, em permanente ebulição – um texto em contínuo movimento.

Sua poesia metalinguística, plástica, furiosa, delicada, passional, corporal, sexual, desbocada, invasiva, libertária, corrosiva, visceral, abusada, dissonante, épica é, antes de tudo, a poesia do livre desejo e do desejo livre. Nela, não há espaço para o silêncio: é berro, uivo, canto e dor. Pulsão. Textura de vida. Uma poesia que arde (em) seu rio de palavras.


lamparão

 

lamparina acesa no trovão

relâmpagos atravessam corredores

lá fora chove canivetes e navalhas

quebradeira geral no umbral

das coisas incompletas

relampejam  nos currais sacramentados

entre a desgraça e a glória

e aqui incorporados

nos porões da  nossa história

 

Artur Gomes

do livro inédito Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim

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quinta-feira, 7 de novembro de 2024

Hoje é dia dela

Hoje É Dia Dela

 

Hoje é dia dela Alice Melo Monteiro Gomes, 14 anos, minha pop star, o motivo e o porque  desde 2011 vir morar em São Francisco de Itabapoana-RJ,  e me integrar a família Melo Monteiro. Quando Alice nasceu meus outros filhos Flora Barbosa Buchaul Gomes tinha 27 anos e Filipe Barbosa Buchaul Gomes, (Fil Buc), tinha 26,  claro que ela é filha de outra mãe. Minha paixão, minha dor de cabeça, minha preocupação com o seu futuro, mas acima de tudo, o meu prazer de ser, o pai e minha gratidão a Ingrid Melo Monteiro, a companheira, mulher que me ama e me acompanha  a 19 anos.

E em termos de relacionamento duradouro, esse é o meu record

* 

Alice
para Alice Melo Monteiro Gomes

A música está no bico dos pássaros
na pétala da lamparina
no caracol dos teus cabelos
no movimento dos músculos
no m das tuas mãos

nada mais sagrado
do que teus olhos acesos
para me iluminar na escuridão

Artur Gomes
do livro O Poeta Enquanto Coisa
Editora Penalux - 2020

 

Artur Gomes

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Estou sem fala. Emocionada demais. Não é uma emoção triste . É a alegria de ser lembrada e homenageada por você , meu amigo Artur Gomes, amigo e poeta maior, que revoluciona palavras, poema, gostos, jeitos , modos de pensar e de amar. Quando conversamos com você , sempre saímos modificados, o sol se altera, a lua passa a falar coisas estranhas , mas tudo encharcado de poesia. Essa é a sua vida , em que tivemos a sorte de estar incluídos no seu compartilhar poético. Beijos !

Estou tomada de saudade do nosso grande, especial amigo-filho, Kapi, poeta andarilho de outras plagas, mas sempre de retorno à nossa amada planície. Nas alegrias da terra , nas injustiças e desigualdades , na poesia imperiosa e no lamento poético, Kapi não silenciava. Estava sempre a postos para chorar, indignar-se ou cantar por ela " em prosa e verso ". Muito obrigada por estar sempre se lembrando dele, para que continue vivo entre nós.

 

                                  Beth Araújo

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Campos VeraCidade

Projeto Sinasefe If Fluminense

Projeto de transformação social através do fomento   a leitura com ações focadas em Arte e Cultura

Um olhar sobre a cidade: no que foi – no que é – e o que pode ser

Atividades

1 – Oficina

leitura – poesia falada – teatro – produção audiovisual

objetivo: levar o participante a ler e se expressar através da escrita, da oralidade, da visualidade e da interpretação cênica

2 – Rodas de Conversa

Abordagens de  temas afins a Educação, Arte, Cultura e Vida Humana no sentido geral.

3 – Sarau Balbúrdia Poética

música teatro poesia

Um grito de alerta contra o fascismo, racismo, e todo e qualquer tipo de violência praticado contra um ser humano.

 

Artur Gomes

Quem é?


É poeta. ator. produtor cultural e vídeo maker. Em 2023, criou o projeto Campos Veracidade  para a Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima onde atualmente atua na coordenação cultural em Campos dos Goytacazes-RJ.

Livros Publicados: Um Instante No Meu Cérebro(1973), Mutações Em Pré-Juízo(1975), Além Da Mesa Posta(1977), Jesus Cristo Cortador de Cana(1979), Boi-Pintadinho(1980-1981), Suor & Cio(1985), Couro Cru & Carne Viva(1987), 20 Poemas Com Gosto de JardiNÓpolis & Uma Canção Com Sabor De Campos(1990), Conkretude Versus ConkrEreções(1994), BraziLírica Pereira : A Traição das Metáforas(2000),  SagaraNAens Fulinaímicas(2015), Juras Secretas(2018), Pátria A(r)mada(2019), O Poeta Enquanto Coisa(2020), Pátria A(r)mada, 2ª Edição revista e ampliada(2022), O Homem Com A Flor Na Boca(2023).

De 1975 a 2002 coor­denou a Oficina de Artes Cênicas da ETFC – CEFET-Campos – no IFF Instituto Federal Fluminense. Em 1993, criou o proje­to Mostra Visual de Poesia Brasileira, Mário de Andrade – 100 Anos, realizado pelo SESC-SP. Em 1995, criou o projeto Reta­lhos Imortais do SerAfim – Oswald de Andrade Nada Sabia de Mim – realizado pelo SESC-SP. De 1996 a 2016, coordenou o Departamento de Audiovisual do Proyecto Sur Brasil – Bento Gonçalves-RS – realizando Mostras Cine.Vídeo na programa­ção do Congressso Brasileiro de Poesia. Em 1999,  criou o FestCampos de Poesia Falada, projeto que é realizado até hoje pela Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima. De 2014 a 2016, dirigiu Curso de Artes Cênicas no SESC – Campos. Em 2018 e 2019, o autor lecionou no Curso Livre de Tetro da Fun­dação Cultural Jornalista Oswaldo Lima. Em 2018, participou como convidado do I Festival Transepoéticas no Museu Naa­cional de Brasília-DF. Em 2021, Curador do 1º Festival Cine Vídeo de Poesia Falada que é realizado na página Studio Fuli­naíma Produção Audiovisual no Facebook*.

Em 2019 criou o projeto Balbúrdia Poética, com duas edições realizadas na Taberna de Laura, em Copacabana – Rio de Janeiro, com a participação de  diversos poetas convidados.

Em 2022, integrou a Mostra Bossa Criativa, Arte de Toda Gente, realizada pela FUNARTE-Rio. Foi também curador da Mostra Cine e Ví­deo de Poesia Falada realizada pelo SESC Piracicaba. Realizou 7 edições do projeto Geleia Geral – Semana de 22 – 100 Anos Depois, na Santa Paciência Casa Criativa em Campos dos Goytacazes-RJ. Em 2023 realizou 8 edições do Sarau Multilinguagens no Museu Histórico de Campos, no Teatro de Bolso, no Jardim do Liceu e no Palácio da Cultura em Campos dos Goytacazes-RJ.

Em 2024  em parceria com Tchello  d`Barros e Luis Turiba realizou  a Balbúrdia Poética 3 – Torquato Leminski a + de 80 a ser realizada no dia 24 de Abril no Bar do Ernesto – Lapa – Rio de Janeiro.

No dia 3 de outubro de 2024 foi eleito para a Academia Campista de Letras.

 

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